terça-feira, 25 de junho de 2013

Uma paixão diferente...

Cheguei a casa. Entrego o saco ao canto da cozinha e vou lavar as mãos como sempre, ainda meio ofegante. Espasmo no joelho, nada de mais, foi o esforço. A sensação é boa! Olho o relógio enquanto tiro os auscultadores dos ouvidos. 23:11h, chegar a tarde e a más horas, de novo. Não faz mal!

Enquanto procuro pelo frigorífico algo que se cozinhe, toco na ferida que tenho na anca, contraída hoje. “Ainda tenho de desinfetar isto melhor”, penso eu, tirando uma caixa de ovos. Hoje é quinta-feira, no fim-de-semana há jogo mas não estou preocupado. Hoje esfolei-me (literalmente) para ser titular. E se não for? Pois, o problema é esse! Espero que o meu trabalho compense, como tem compensado. Afinal de contas, dei o meu máximo, ninguém me pode pedir mais! 

 Consegui melhorar a receção hoje, já não deixo fugir tanto a bola. Irritava-me imenso ter de dar um mini sprint depois do primeiro toque após um passe longo. Eram centésimos de segundo em que perdia a imprevisibilidade que me marcava. Sentei-me na mesa com o prato à frente e começo a comer. Depois de fazer o “holandês” aquele exercício que todos se queixam, mas que eu, como sendo dos elementos mais velhos, não me posso queixar o Nano veio à minha beira e disse-me: “Vamos lá Ruizinho, só mais uns sprints, ninguém te pára hoje!” Foi como 3lts de RedBull! Confiança no auge, vamos lá para a parte final do jogo, onde não se pode falhar: jogo! Hoje não passa nada, nem hoje nem nunca! Siga! 

Do outro lado está o rapaz mais rápido e mais imprevisível da equipa, não podia ter tido mais azar, ou sorte! É o nosso melhor extremo, mas quem melhor para me treinar?! Do meu lado está o capitão, tudo seguro com este! “Siga lá pessoal, fazer esta bosta direito para Domingo ganhar!”, gritei eu! Depois de 10 minutos lá veio o carrinho que tive de fazer para evitar um remate, pedras, areia e terra é o que não faltam na minha anca. Não pára! Segue sempre! Há uma equipa para proteger, um lugar a defender, pessoas que não merecem ser desapontas! Temos de querer isto, a vitória, a glória, a evolução, mais que eles, por isso a dor tem de ser posta de parte! 

Acaba o jogo, procuro água e passo na ferida! “C%(&$*-?!!! Isto arde!”, ao que se aproxima o meu treinador e diz: “Bom treino Ruizinho!”. Já posso descansar em paz hoje, deixei quem mais interessava satisfeito! Ligo a televisão e em pouco tempo adormeço. 

Domingo! Dia de jogo! Escorre-me o suor depois do aquecimento. O dia está quente, o ar seco e estamos a jogar em casa. Visto a camisola de jogo enquanto o “mister” diz o meu nome na lista de titulares. Já está! Nervosinho miúdo presente! Por mais jogos que se façam, ele está sempre presente! Vou e cumprimento o Nuno, “Vamos mano!”, responde-me ele e sorri! Subo as escadas do túnel e as pessoas lá fora batem palmas, os poucos resistentes que vêm ver a equipa local jogar. Por muito poucos que sejam, têm de ser sempre honrados! Acreditam em nós e não merecem uma derrota. Levamos na cabeça as palavras ditas no balneário. O jogo não é fácil mas juntos, unidos, iremos sempre conseguir! Apito inicial: adeus mundo! Estou no futebol agora e só quero saber da bola, do extremo adversário e que o marcador tenha um número mais alto para o nosso lado! Estamos intensos hoje, é assim que gosto, jogo rápido onde não me canso! Vamos a ganhar para o intervalo! “É continuar, ir para cima deles! A bola tem de ser nossa, dê por onde der! Nem que tenham de comer areia!” Disse-nos o mentor! “BORA LÁ!!!”, grito eu enquanto subimos as escadas ela segunda vez. O meu treinador passa por mim e diz que estou perfeito hoje, para continuar! As melhores palavras que podia ouvir foram ditas. Confiança, audácia, tudo no auge! Hoje é o meu dia! Abri de novo a ferida, quem se interessa? Não se sente nada! A paixão é maior, a dor é secundária! Todos os teus sentidos estão focados apenas naquilo e durante pouco mais de uma hora e meia, o teu mundo gira apenas em torno daquilo. Aquilo que amas! Acaba o jogo e podemos ir para casa com uma vitória, agradecemos aos adeptos e ouve-se: “Bom jogo Ramôa!”, é tudo que se pede! Reconhecimento de quem está contigo, a teu lado mas também de quem vê de fora! 

E isto é paixão! Paixão que não morre! Tenho pena de quem não pode sentir isto, de quem não sabe o que é isto. De quem não sabe o que é este compromisso, esta entrega, esta dor, este amor! Afinal que sabem eles o que é união, trabalho de equipa, sucesso, glória? Que sabem eles o que é orgulho? Orgulho em ti próprio, orgulho nos outros! Que sabem eles se ninguém se orgulha deles a este ponto? Que sabem sobre o que é uma equipa? Que sabem sobre quem sou, se nunca me viram jogar, se nunca viram que sou temperamental mas que não o mostro, que sou benevolente, que sou certo mas não agressivo… Que sabem eles da vida se nunca tiveram nada disto? A felicidade não consiste em fazer o que gostamos apenas. Mas sim gostarmos do que fazemos, da dedicação, do esforço, da dor…

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